O objetivo do discipulado

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O objetivo do discipulado está claro em todo o Novo Testamento. Tanto Jesus como os Seus discípulos, incluindo Saulo de Tarso e as gerações subseqüentes no primeiro século, mantiveram viva a chama do cuidado individual, do amadurecimento em Cristo e da multiplicação dos valores do Reino tanto a nível pessoal como corporativo. Contudo, podemos ser ainda mais específicos quanto a ele. Devemos nos perguntar que mudanças Deus tem feito na vida de outras pessoas através da nossa vida. Temos sido continuadores dessa cadeia poderosa de vida e serviço? Qual é o objetivo desse discipulado ontem e hoje?

Abrir caminho para a evangelização

Alguns chamam de pré-evangelismo a instrução de doutrinas básicas da fé cristã. O pré-evangelismo é ao mesmo tempo tanto didático como apologético. É didático porque se propõe a estabelecer as doutrinas fundamentais sobre o trino Deus, o que é a Bíblia, pecado, graça, perdão, expiação, céu, inferno, e tantas outras palavras-chaves que preparam o evangelizado para receber a verdade integral para a sua vida.

Vivemos numa sociedade pós-moderna onde não basta apenas dizer: arrependa-se e creia em Cristo. É possível que no decorrer dos estudos você descubra que o discípulo carrega consigo uma carga enorme de conceitos estranhos e talvez anticristãos que recebeu em sua formação. É necessário redefinir palavras, com fidelidade à Escritura.

A formação de um novo caráter nos indivíduos

Este é o aspecto que visa implantar no discípulo um caráter que mais se aproxime da imagem de Jesus Cristo (Romanos 8.29). Portanto, não é algo a ser aplicado apenas a um cristão menos experiente ou com pouca idade, com pouco ou muito tempo de igreja, pouca ou muita experiência de vida. Pelo contrário, destina-se a cristãos comprometidos e humildes o suficiente para reconhecer que ainda necessitam de transformação.

A santificação é progressiva. Consequentemente, os relacionamentos serão mais bem vivenciados quando se vive numa atmosfera comunitária de discipulado bíblico (Atos 2.42-47).

Evangelização pela amizade

A evangelização eficaz acontece através da amizade. Pessoas que demonstram o amor de Cristo, que se preocupam umas com as outras, são pessoas que cuidam umas das outras. O papel do discipulado é explicar o porquê desse cuidado e comunhão. A transformação pessoal através de relacionamentos ocorre quando o amor de Deus é manifesto através dos seus filhos (João 17.20-23). Existe uma legítima diferença entre evangelismo e discipulado. John R.W. Stott comenta quê:

 

No evangelismo proclamamos a loucura do Cristo crucificado, a qual é a sabedoria de Deus. Decidimos não saber mais nada e, mediante a insensatez dessa mensagem, Deus salva aqueles que nele creem. No discipulado cristão, entretanto, ao levar pessoas à maturidade, não deixamos a cruz para trás. Longe disso. Antes, ensinamos a completa implicação da cruz, incluindo nossa suprema glorificação.

 A Bíblia afirma que os cristãos sobrevivem e crescem nos relacionamentos mútuos:

  • Somos membros uns dos outros (Romanos 12.5)
  • Amando cordialmente uns aos outros (Romanos 12.10).
  • Honrando uns aos outros (Romanos 12.10).
  • Tendo o mesmo sentir uns para com os outros (Romanos 12.16; 15.5).
  • Amando uns aos outros (Romanos 13.8).
  • Edificando uns aos outros (Romanos 14.19).
  • Acolhendo uns aos outros (Romanos 15.7).
  • Admoestando uns aos outros (Romanos 15.14).
  • Saudando uns aos outros (Romanos 16.16).
  • Esperando uns pelos outros (I Coríntios 11.33).
  • Importando-se uns com os outros (I Coríntios 12.25).
  • Servindo uns aos outros (Gálatas 5.13).
  • Levando as cargas uns dos outros (Gálatas 6.2).
  • Suportando uns aos outros (Efésios 4.2; Colossenses 3.13).
  • Sendo benignos uns para com os outros (Efésios 4.32).

Fica claro que só seremos reconhecidos como seguidores, discípulos de Jesus, quando demonstrarmos isso no trato com os nossos irmãos. Somente quando andamos em amor horizontal, servindo ao nosso semelhante, levando as suas cargas e andando juntos no caminho da cruz é que os céus e a terra reconhecerão a nossa ligação vertical com o Pai.

Crescimento numérico natural

Uma igreja local saudável se desenvolve e cresce naturalmente. Lucas narra que “a igreja, na verdade, tinha paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria, edificando-se e caminhando no temor do Senhor, e, no conforto do Espírito Santo, crescia em número” (Atos 9.31).

Quantas pessoas se converteram através da minha evangelização? É triste saber que há cristãos que nunca levaram ninguém a Cristo. É óbvio que quem realiza a obra sobrenatural e regeneradora é o Espírito Santo, mas Deus decidiu chamar pecadores perdidos através de pecadores perdoados. O apóstolo João relata que André, após conhecer pessoalmente a Jesus, foi em busca de seu irmão Simão e “o levou a Jesus” (João 1.42).

A igreja atual tem gradativamente perdido a noção de que cada cristão é um ganhador de almas. Até mesmo a expressão “ganhador de almas” soa um tanto que estranho aos nossos ouvidos pós-modernos, mas era um termo muito comum até o fim do século 19. Esta expressão é uma menção à declaração do apóstolo Paulo, que disse: porque, sendo livre de todos, fiz-me escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível (I Coríntios 9.19).

Somos cooperadores desta maravilhosa obra de reconciliação. A Escritura declara que “somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus” (II Coríntios 5.20). Evangelizar é compartilhar Jesus, no poder do Espírito, deixando os resultados com Deus. Contudo, devemos regar a semente plantada, enxotar as pragas e ervas daninhas, e garantir não só a maturação dos frutos como a sua reprodução em novas plantas igualmente saudáveis.

Amadurecimento espiritual

Esta divisão se refere principalmente à formação de líderes que estarão discipulando no futuro. Mas haverá também multiplicação dos discípulos de Cristo, pessoas que serão tratadas no seu caráter e transformadas para glória de Deus, a fim de ocuparem outros lugares na Igreja de Jesus.

É comprovado por pesquisas que nos primeiros meses de conversão o potencial evangelístico do cristão é muito mais aguçado. Se as células estiverem abertas a visitantes, serão também um forte instrumento de evangelização, pois o novo convertido desempenhará como nenhum outro a tarefa de trazer pessoas para ouvirem a mensagem de Cristo, além do resultado positivo que a comunhão pode produzir no coração do visitante.

Preparo para os ministérios no Corpo de Cristo

Os ministérios na igreja local são diversos e também diversos os dons. Portanto, o discipulado deve visar também os demais ministérios dentro da Igreja. Teremos como um resultado natural um número maior de membros envolvidos na evangelização, evitando a ociosidade e outros problemas consequentes. A mente desocupada é produtiva oficina do diabo!

Nenhum ministério (serviço) é superior ao outro. Um ministério depende do outro. Todos os ministérios devem cooperar entre si. Dentro dessa visão, o discipulado ocorre em duas frentes. A primeira visa a edificação, o crescimento pessoal do indivíduo enquanto pessoa, filho de Deus e membro do Corpo de Cristo. A segunda objetiva fazer dele um obreiro, um cooperador, um multiplicador da vida de Deus em outros.

Os ministérios são fortalecidos quando um membro que tem determinado chamado, determinado dom, é acompanhado por alguém que já milita naquela direção. Por exemplo, um músico novo convertido acompanhado por alguém da rede de louvor e adoração será bem suprido tanto na vida pessoal como na sua inclinação vocacional. Da mesma forma, um professor crescerá e desenvolverá os seus dons (naturais e espirituais) quando caminha junto com alguém que flui nessa área.

 

Extraído, com adaptações, do livro Ide e fazei discípulos: fundamentos práticos para ser e fazer discípulos de Jesus, de Abe Huber e Ivanildo Gomes. Publicado em Fortaleza pela MDA Publicações e Premius Editora, 2012. pp.69-73.