Sem desculpa

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Sem desculpa

Texto básico: Romanos 1.18-21

Leitura diária
D Sl 19.1-6 Sua Glória na criação
S Rm 1.18-32 Deus se deu a conhecer
T Rm 2.1-16 Somos responsáveis
Q Lc 12.35-48 Muitos e poucos açoites
Q At 14.8-18 Testemunho diário
S At 17.24-31 Chamada ao arrependimento
S 2Pe 3.8-13 Deus não se atrasa

Introdução

Ninguém pode alegar inocência ao infringir uma lei simplesmente por desconhecê-la. Mas e os que não tiveram acesso ao evangelho? Estão isentos da condenação por seus atos? Até que ponto o homem é realmente inocente? Em que grau o homem pode conhecer a Deus por conta própria, se é que o pode?

Neste estudo aprenderemos que Deus revelou para nós suficiente conhecimento de si mesmo e, por isso, todos são responsáveis e indesculpáveis diante dele. Logo, quais são as consequências para aqueles que negligenciam ou rejeitam esse conhecimento que Deus deu de si mesmo? É o que estudaremos nesta lição. 

I. Passa a ser alvo da ira de Deus

O apóstolo Paulo começa esta seção da sua carta mencionando a ira de Deus. Geralmente vemos a menção ao amor, misericórdia e graça de Deus, mas, dificilmente se fala da sua ira. É verdade que a ira de Deus não pode ser comparada ao mesmo sentimento humano que muitas vezes é movido pelo ódio, inveja ou rancor. No entanto, quando Paulo fala da ira de Deus, ele se refere à justa indignação e recompensa ao homem por causa do seu pecado. Esta ira nada mais é do que uma manifestação santa e incontestável da sua justiça. Mas por que Deus está irado com o ser humano? 

A. Porque ele rejeitou o conhecimento de Deus

Deus está irado contra toda impiedade, perversão e injustiça humanas (Rm 1.18). O homem chegou a esse ponto não por um acidente ou erro de percurso, e sim, porque ele rejeitou deliberadamente o testemunho que Deus deu a respeito de si mesmo. Em teologia nós chamamos esse testemunho ou manifestação de revelação geral. Essa revelação é chamada de geral porque é destinada a humanidade como um todo. Paulo menciona dois aspectos desta revelação em sua argumentação: a criação e a consciência humana.

1. Na criação A Bíblia nos diz que há manifestação de Deus o suficiente na criação de tal maneira que é impossível negar a existência do Criador. No salmo 19 lemos que “os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia a obra de suas mãos”. Há uma linguagem silenciosa que comunica a atividade criadora e governadora de Deus (Sl 19.3,4). Este é o mesmo argumento de Paulo ao escrever aos romanos. Deus manifestou o seu eterno poder e divindade por meio das coisas que foram criadas (Rm 1.19,20). Em outra ocasião, o mesmo apóstolo se refere a fenômenos e sentimentos naturais como um testemunho de Deus a respeito de si mesmo (At 14.17). Isto significa que todas as pessoas, inclusive aquelas que não possuem a Bíblia, tiveram acesso à demonstração da existência e do poder de Deus (Rm 10.18). Mesmo após a Queda, o homem continua sendo um ser moral e responsável por seus atos. Logo, responderá pelo fato de ter desprezado a manifestação de Deus na criação.

2. Na consciência Paulo, no entanto, aponta para uma segunda maneira como Deus manifestou-se ao homem. Ele refere-se ao ser humano como alguém que tem a norma da lei gravada no coração, cuja consciência dá testemunho (Rm 1.15). Isto nos mostra que, por maior que seja o desconhecimento do evangelho por parte de alguém, essa pessoa possui um padrão de conduta pelo qual ela julga as ações alheias e pelo qual terá também um dia as suas ações julgadas, pois ela mesma é infratora daquilo que considera correto.

Esses dois pontos mostram que o homem rejeitou o conhecimento de Deus, tanto o adquirido por meio da criação como aquele que advém do seu senso moral. Daí a razão da ira de Deus sobre o homem. Ele não desobedeceu a Deus por acidente e, sim, propositalmente, pois desprezou todo o conhecimento que Deus deu de si mesmo. 

B. Porque não glorificou a Deus

Outra razão pela qual Deus se irou contra o pecador é porque, apesar de todo o conhecimento que tinha a respeito de Deus, esse pecador preferiu não glorificá-lo (Rm 1.21). Resolveu servir a criatura no lugar do Criador. Porém, quando isto aconteceu? Será mesmo que hoje ninguém poderá alegar ignorância pela idolatria cometida? Em primeiro lugar vejamos quando isto aconteceu ou acontece.

Paulo está se referindo primariamente aqui à queda de Adão e Eva. Apesar da condição de comunhão em que eles se encontravam, não glorificaram a Deus como deviam por meio da obediência requerida. Antes, colocaram-se no lugar do próprio Deus. Porém, isso também tem ocorrido sucessivamente na História. Muitas pessoas, mesmo conhecendo o evangelho e até mesmo o ensino nas Escrituras que os seus pais lhes deram, resolvem seguir a sua própria vontade, desprezando assim os mandamentos e a obediência a Deus. Também há o caso de nações onde um dia ocorreu uma grande manifestação do evangelho, porém hoje, vivem uma cultura pós-cristã ou totalmente anticristã. Muitos dos países mulçumanos hoje foram berço do Cristianismo, e muitos países que já enviaram missionários, hoje precisam recebê-los.

Na realidade, o que devemos nos perguntar com toda a sinceridade é: a idolatria é fruto do pecado ou da ignorância? Também devemos responder: se a ignorância justifica alguém, por que mandar missionários? E se o caso em questão não é rebeldia e sim desconhecimento, porque muitos, mesmo ouvindo do evangelho não abandonam as suas práticas idólatras? Em muitos casos até mesmo perseguem ou matam aqueles que lhes falam de Cristo.

O cerne da questão é que o homem resolveu não dar a glória devida a Deus. Ele resolveu assumir o lugar do Criador no centro do universo.

C. Porque ele é um ser moral

Por último, o homem está debaixo da ira de Deus por ser uma criatura moral e, por isso, responsável por seus atos. Como tal, ele deliberadamente desobedeceu a Deus, por isso ele é culpado, sujeito à justa retribuição por causa do seu pecado e desobediência (Rm 2.5,6).

Porém aqui surge uma questão. O que dizer daquelas pessoas que não possuem uma Bíblia ou não frequentam uma igreja para saberem o que é certo ou errado? Desses, Paulo diz que eles possuem uma consciência que serve de lei para si mesmos. Inclusive, a partir desse senso moral, as pessoas tanto se acusam como se defendem (Rm 2.15). Também é importante lembrar que a Queda não tirou a responsabilidade humana. O homem continua respondendo por seus atos e escolhas.

II. Entregue a sua própria vontade

Há também outras consequências para aqueles que se rebelam contra o conhecimento que Deus deu a respeito de si mesmo. Deus simplesmente os deixa seguir o seu próprio caminho (Rm 1.24, 28). Uma vez que eles abriram mão de Deus, Deus abriu mão deles. Os resultados são os mais desastrosos possíveis. Paulo menciona alguns deles.

A. Seguem a mentira

A primeira consequência dessa rebeldia é uma vida atolada na mentira. A partir de então, o homem é descrito como alguém nulo em seu raciocínio, de coração obscurecido e insensato (Rm 1.21) e disposição mental reprovável (Rm 1.28). Em outro lugar Paulo fala dessas mesmas pessoas como aqueles que andam na vaidade dos seus próprios pensamentos e obscurecidos de entendimento (Ef 4.17,18).

Na realidade o que aconteceu é que, para o ser humano, desde o momento em que perdeu o referencial máximo de todas as coisas que é Deus, tudo mais ficou sem sentido. Ou seja, a partir do momento em que o homem passou a negar as verdades absolutas sobre Deus, outros conceitos assumiram o seu lugar, inclusive em relação a todas as demais áreas da vida. Isso pode ser observado no casamento, na ciência, na compreensão da natureza, no conceito sobre felicidade, origem e propósito da vida, etc. Percebemos que muitos vivem um mundo de mentiras, pois a verdade sobre Deus foi negada. E quando isso acontece, todos os demais relacionamentos são prejudicados. 

B. Praticam a idolatria

Outro resultado na vida do que foi entregue a si mesmo, é a idolatria. Paulo diz que preferiram servir a criatura no lugar do criador (Rm 1.25b). Um ser criado a imagem e semelhança de Deus, criou um deus a sua imagem e semelhança.

Alguns manifestam uma forma mais rudimentar de idolatria por meio de imagens de pessoas ou animais. Outros, no entanto, glorificam a fama, o prestígio, o dinheiro, a sua profissão ou a si próprios. No entanto, a razão é a mesma, não se submeter a Deus que nos criou. Como o profeta Isaías já havia dito, o idólatra acaba se alimentando de cinzas (Is 44.20). Quando o ser humano torna-se um idólatra, acaba se alimentando de cinzas, seja no campo da moralidade, dos relacionamentos e de todos os aspectos da vida diária. Enfim, tudo o que deveria trazer sentido a vida, nada mais é do que cinzas. Deixa-se então de desfrutar a vida abundante prometida por Jesus (Jo 10.10).

C. Cultivam o pecado

Uma outra consequência trágica para o ser humano deixado à sua própria vontade é que ele passa a buscar desenfreadamente satisfazer suas próprias paixões. Paulo menciona algumas delas: as mulheres passaram a usar da sua feminilidade para alcançar objetivos pessoais, homossexualismo, injustiça, malícia, avareza, maldade, inveja, homicídios, contendas, dolo, malignidade, difamação, calúnias, insolências, soberba, desobediências aos pais, etc. (Rm 1.26,27,29-31).

Ainda que essa carta tenha sido escrita há quase dois mil anos, ela retrata bem a realidade em que vivemos. Notamos que essas práticas não são apenas uma consequência de um desconhecimento da Bíblia e sim a inclinação daqueles que foram entregues a seguirem suas próprias paixões. O que se pode concluir até então é que essas são as consequências daqueles que deliberadamente rejeitam o conhecimento de Deus. 

III. Sofrerá justa condenação

É importante lembrar aqui que Paulo está ensinando que ninguém poderá se auto justificar diante de Deus. No início da carta ele apresenta o tema que irá tratar, o evangelho como o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e depois do grego (Rm 1.1-17). Logo em seguida ele passa a demonstrar como aqueles que não são judeus também precisavam de salvação por estar debaixo da ira de Deus. Ainda que eles não possuíssem o mesmo grau de revelação que os judeus possuíam, eles também eram indesculpáveis (Rm 1.18.2.16). Com eles podemos comparar aquelas pessoas hoje em dia que não possuem a Bíblia, ou seja, nunca foram expostas ao evangelho. Logo em seguida, Paulo também demonstra que mesmo os judeus estavam debaixo da ira de Deus e também precisavam de um salvador (Rm 2.17.3.8). Semelhantemente são aqueles que hoje estão expostos ao evangelho ou tem acesso a Bíblia. Enfim, conclui Paulo, todos pecaram, estão separados de Deus (Rm 3.23) e precisam de um Salvador.

Agora, se o primeiro grupo não possui a revelação de Deus, ou seja, a Bíblia, e nunca ouviram do evangelho, como Deus manifestará a sua justiça em julgá-los? Será justa a condenação destas pessoas? A resposta é sim, pelos seguintes motivos.

A. Porque o juízo será baseado na sua própria lei moral

Primeiro, o juízo que Deus exercerá, não será sobre algo que as pessoas desconhecem. Será a partir da própria lei moral que eles possuem gravada em seus corações. Paulo dá algumas razões para a existência de um imperativo moral que cada ser humano possui dentro de si mesmo.

1. A consciência do certo e do errado – O apóstolo diz que o homem reconhece a sentença de Deus (Rm 1.32). Ou seja, ele sabe que é passível de condenação por causa dos seus erros. Conscientemente ninguém poderá alegar que vive uma perfeição ética e moral. Uma das evidências disto, é que o ser humano procura sempre se justificar de duas formas: uma é acusando o seu semelhante e a outra é defendendo-se dos seus erros (Rm 2.15). Na primeira ele sugere que há pessoas piores do que ele, e na segunda, de que ele não é tão mal e sempre há uma boa razão para se fazer o que foi feito. Essas situações só demonstram que o homem possui dentro de si mesmo um senso moral, que Paulo chama de a norma da lei gravada no coração. (Rm 2.15).

2. A capacidade de julgar os outros – Outro ponto que mostra também a retidão da justiça de Deus em julgar o homem com base na própria lei moral deste, é que esse homem também exerce julgamento sobre os outros.

O texto bíblico diz que, a partir do momento em que o ser humano estabelece critérios de julgamento em relação ao seu próximo, ele já estabeleceu também a sua própria condenação e confissão de culpa (Rm 2.1). A razão é simples, pois quem é que pode dizer que nunca violou o código moral que espera que os outros venham a cumprir? Uma vez que somos capazes de julgar o nosso semelhante, também estamos sujeitos ao mesmo julgamento.

Logo, para aqueles que desconhecem o evangelho, Deus simplesmente os julgará com base naquilo que eles mesmos aprovam ou desaprovam (Rm 2.3). E o resultado será inevitável: todos estão condenados e debaixo do pecado (Rm 2.15,16). 

B. Por desprezar a bondade de Deus

A condenação de tais pessoas também é justa, não somente porque elas serão julgadas com base naquilo elas já sabem, como também com base no desprezo pela bondade de Deus. O homem natural procura se autoconvencer da não existência de um juízo divino (2Pe 3.3,4). Contra isso, ele utiliza como argumento a continuidade da criação, promovendo assim um falso ambiente de segurança. No entanto, ele não considera que essa aparente demora em Deus manifestar a sua justiça final é, na realidade, uma demonstração de bondade, paciência e tolerância, a fim de que o pecador em algum momento se arrependa (Rm 2.4). Ao proceder assim, tudo o que homem acumulará para si mesmo é a ira divina (Rm 2.5), que será dada a cada pecador não arrependido como recompensa pelos seus atos (Rm 2.6-11).

Conclusão

Há uma tendência generalizada em se encontrar razões para desculpar o homem diante de Deus. Um desses argumentos é baseado na ignorância. Afirma-se que aqueles que nunca tiveram acesso à mensagem bíblica, não podem ser condenados. Aliás, seria injusto da parte de Deus se ele assim procedesse.

No entanto, o que aprendemos da Bíblia é que não há razões para o homem alegar inocência diante do seu Criador. Deus manifestou na criação conhecimento suficiente de si mesmo, além do que, também deu ao homem um senso moral. É baseado nesse conhecimento e nessa capacidade de julgar os atos alheios que o homem também será julgado. Portanto, não será exigido nada dele que não houvesse sido dado. Logo, a única conclusão a que podemos chegar é que o homem precisa desesperadamente de um salvador e o evangelho é poder de Deus para a salvação de todo aquele que nele crê.

Aplicação

1. Uma vez que sabemos que ninguém poderá se desculpar diante de Deus, sendo assim todos culpados, o que podemos fazer para que o evangelho chegue a essas pessoas?

2. Qual tem sido a nossa atitude como cristãos que conhecem o caminho da salvação diante daqueles que se encontram debaixo da ira de Deus?


> Autor do Estudo: Sérgio Ribeiro Santos

>> Estudo publicado originalmente na revista Palavra Viva – Sangue na porta, da Editora Cultura Cristã. Adaptado do livro A obra consumada de Cristo, de Francis A. Schaeffer. Usado com permissão.

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Fonte