Eleição: Escolhidos em Cristo

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Eleição: Escolhidos em Cristo

Texto básico: Efésios 1.1-14

Leitura diária

D – Ef 2.1-10 Pela graça mediante a fé
S – 2Tm 1.8-9 Deus determinou
T – Rm 8.28-30 Segundo seus propósitos
Q – Rm 9.6-13 A eleição
Q – Rm 9.19-29 De modo soberano
S – Jo 6.41-46 Conduzido a Cristo
S – At 13.44-52 Os que são eleitos

Introdução

A doutrina bíblica da eleição sempre foi muito rejeitada em certos grupos evangélicos. Um dos grandes motivos para essa rejeição é o alegado fato de que ela mina o estímulo cristão para a santificação. Outros motivos têm surgido em todas as épocas e lugares, mas todos eles são ocasionados por um entendimento inadequado dessa doutrina. Trataremos do ensino transmitido por Paulo aos crentes de Éfeso sobre esse assunto, na esperança de que esse estudo seja proveitoso para nossa edificação em Cristo.

I. O fundamento da eleição (1.3-4)

O fundamento da igreja, da salvação e da própria eleição é Cristo. Veja a afirmação de Paulo nos versículos 3 e 4: “O Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo… nos escolheu nele”. Para fazer com que a conexão entre a escolha (eleição) feita por Deus de Cristo como fundamento da eleição fique mais clara, poderíamos traduzir essa frase da seguinte forma: “Deus, o Pai, nos abençoou com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo, assim como nele nos escolheu antes da fundação do mundo”, ou seja, Deus nos escolheu em Cristo desde a eternidade e, em um dado momento no tempo, nos abençoou em Cristo, dando-nos a salvação e todas as bênçãos espirituais dela decorrentes.

Ao afirmar que Cristo é o fundamento da eleição, o apóstolo Paulo automaticamente descarta toda e qualquer participação humana na salvação. Até mesmo o exercício da fé, mediante a qual nos apropriamos da salvação oferecida por Deus em Cristo, é um fruto da graça. É o próprio Deus quem nos capacita a crer para que possamos nos apropriar da salvação que foi plenamente realizada por Cristo em nosso lugar e em nosso favor na cruz do calvário. A salvação, diz Paulo, assim como a eleição, é fruto da graça: “Pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2.8-9. Veja também Ef 1.6). A eleição é fruto da graça de Deus, não o resultado de uma previsão feita por Deus de que este ou aquele pecador teria fé. Ele não apenas “previu” que um determinado pecador teria fé em Cristo, mas determinou dar a fé a um determinado pecador para que ele cresse em Cristo e fosse salvo. A eleição feita por Deus não é uma simples previsão, mas uma escolha. Até mesmo a fé é decorrente da graça (Ef 2.8), pois é uma das bênçãos espirituais que o pecador recebe de Deus em virtude de sua eleição (Ef 1.3). Isso significa que a eleição é incondicional e em nada depende das obras humanas, como podemos ver em várias passagens das Escrituras (Rm 3.28; Gl 2.16; 3.11; Ef 2.8-9). Esta foi a grande descoberta de Lutero e é a grande bandeira das igrejas reformadas. O fundamento da eleição é o livre, soberano e misterioso decreto de Deus mediante o qual ele, em sua livre soberania, decidiu, movido tão somente pela sua própria graça, dentre todos os pecadores, que estavam igualmente mortos em seus delitos e pecados, escolher alguns para que fossem salvos por Jesus Cristo. Essa escolha, como já vimos, não se baseia em qualquer mérito humano, pois pecadores espiritualmente mortos não podem convencer Deus a ser-lhes favorável. Esse é o ensino de Paulo em Romanos 4.4-6: “Ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e sim como dívida. Mas, ao que não trabalha, porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça [e a atribuição da fé é uma obra da graça de Deus, e não um ato meritório do pecador]. E é assim que Davi declara ser bem-aventurado o homem a quem Deus atribui justiça, independentemente de obras”.

O cristão deve louvar a Deus por ter sido escolhido em Cristo (Ef 1.4), pois se a sua eleição dependesse de si mesmo ele nunca creria, porque o homem natural está espiritualmente morto em seus delitos e pecados (Ef 2.1-2) e uma pessoa nessa situação jamais terá qualquer mérito diante daquele que é a Santidade Absoluta, Perfeita e Eterna. Não há dúvida de que, entregue a si mesmo, o pecador jamais se decidiria por Cristo, pois o homem natural é livre apenas para, seguindo o curso deste mundo, fazer a vontade de Satanás, que é o senhor e mestre de todos aqueles que estão espiritualmente mortos. Esse é o ensino de Jesus em João 5.39-40: “Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim. Contudo, não quereis vir a mim para terdes vida” (Leia também 8.34; 43-47; 10.25-29).

Chamo agora sua atenção para uma implicação muito importante com relação à eleição. Paulo diz que os cristãos foram escolhidos em Cristo antes da fundação do mundo. A expressão “antes da fundação do mundo” aponta para a eternidade. Além disso, o próprio fundamento da eleição, que é Cristo, é eterno. Isso significa que a eleição tem fundamento eterno e, portanto, validade eterna. Aquele que nos escolheu espontânea e graciosamente não nos lançará novamente nas trevas. Aquele que começou a boa obra em nós há de completá-la até ao dia de Cristo Jesus (Fp 1.6; Jo 6.39; 10.28; 2Tm 1.12). Tanto o começo da ação da graça quanto a sua plenitude são obras de Deus, fundamentadas no eterno Filho de Deus.

II. O objeto da eleição

Agora que já sabemos qual é o fundamento da eleição, cabe-nos falar sobre o objeto ou o alcance da eleição. Paulo diz aos Efésios que o objeto da eleição somos nós (Ef 1.4). O pronome “nós” deve ser entendido à luz de seu contexto. Paulo está escrevendo aos santos que vivem em Éfeso e fiéis em Cristo Jesus (Ef 1.1). Pouco depois ele diz que Deus nos tem abençoado e nos escolheu (Ef 1.3,4). Como podemos observar, Paulo está falando que ele mesmo e os santos e fiéis são abençoados com toda sorte de bênçãos espirituais e foram escolhidos em Cristo. Esse é o sentido da passagem.

Este ensino de Paulo sobre o alcance da eleição levanta algumas questões, mas a principal delas é a seguinte: Cristo morreu por todas as pessoas sem exceção ou somente por aqueles que ele escolheu? Em outras palavras: O sacrifício de Cristo na cruz do calvário apenas tornou possível a salvação para todos os homens ou certamente garantiu a salvação para todos aqueles que o Pai lhe deu (Mt 1.21; Jo 6.44; 10.26-29; 15.16; 17.9)? Repare que a grande questão a ser respondida aqui não é se Jesus teve poder para salvar todos os pecadores sem distinção, mas se ele quis fazer isso. A Escritura nos ensina que Cristo é o Senhor da glória (1Co 2.8), o Autor da Vida (At 3.15). Jesus Cristo é o próprio Deus, por isso podemos afirmar que ele teria poder suficiente para salvar toda a raça humana se esse fosse o seu plano. O que Paulo ensina é que a eleição é limitada pela vontade de Deus, que não quis salvar toda a raça humana, mas apenas uma parte dela.

Veja o testemunho claro da Escritura sobre esse assunto: “Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura não nos dará graciosamente com ele todas as coisas? Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus?” (Rm 8.31-33). “Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5.25). “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem” (Jo 10.27). “Vós [os eleitos que são forasteiros da Dispersão – 1Pe 1.1], porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pe 2.9). Em todas essas passagens podemos observar claramente que Cristo não morreu para salvar todos os pecadores sem exceção, mas um certo grupo dentre eles.

Johnatan Edwards, em seu livro The Death of Death in the Death of Christ [A morte da morte na morte de Cristo] propõe o seguinte argumento para explicar o alcance da eleição.

Com relação à salvação, apenas uma dessas alternativas pode ser a correta:

  1. Cristo morreu por todos os pecados de todos os pecadores;
  2. Cristo morreu por alguns pecados de todos os pecadores;
  3. Cristo morreu por todos os pecados de um grupo de pecadores;
  4. Cristo morreu por alguns pecados de um grupo de pecadores.

Observe que as opções “b” e “d” não podem ser verdadeiras, pois nesse caso, se Cristo tivesse morrido apenas por alguns pecados, haveria pecados que estariam fora do alcance de seu perdão e, por isso, não haveria salvação, e a Bíblia diz que há. Ficamos, portanto, com as opções “a” e “c”. Se admitirmos que Cristo morreu por todos os pecados de todos os pecadores, teremos que descobrir o motivo pelo qual muitos deles vão para o inferno (esse é um fato inegável, também abundantemente mostrado na Escritura). A resposta óbvia é: Por causa da sua incredulidade, que os impede de se apropriarem da obra de Cristo pela fé. Ora, mas a incredulidade não é um pecado? Então ela está incluída em todos os pecados que foram perdoados por Cristo e o pecador tem que ir para o céu mesmo sem crer em Jesus, o que é um absurdo. Se a incredulidade não é um pecado, então porque tanta gente vai para o inferno por causa dela? Esse raciocínio nos conduz à única opção viável, que é a letra “c”.

Esse é o ensino bíblico a respeito do alcance da eleição, conforme ensinado por Paulo em Efésios 1.4. Mas qual será o propósito de Deus em agir dessa forma?

III. O propósito da eleição

Deus, com toda a sua infinita sabedoria e poder, tem um propósito definido tanto na criação quanto na redenção do pecador. Esse propósito é mencionado várias vezes na Escritura (2Tm 1.9; Sl 33.11; Is 37.26; 46.9-10; Mt 25.34; Is 14.24). À luz dessas passagens, fica claro que Deus tem um propósito, um plano. Mas qual será o propósito de Deus na eleição do pecador?

O propósito da eleição é revelar a glória de Deus. Não existe propósito maior e mais sublime do que glorificar a Deus. Foi para isso que fomos criados e foi para isso que todo o universo foi criado. Deus, querendo revelar sua própria glória, determinou criar o mundo e permitir a queda do homem, que foi criado sem pecado, mas com liberdade absoluta. Ao usar sua liberdade para rebelar-se contra Deus, automaticamente o homem perdeu toda a liberdade que possuía, tornando-se um escravo do pecado (Jo 8.35; Rm 6.6,17,20; Tt 3.3; 2Pe 2.19) e filho de Satanás (Gn 3.15; Jo 8.44; At 13.10; 1Jo 3.10), tornando-se merecedor da punição reservada por Deus (Mt 25.41). O primeiro pecador gerou toda uma raça que herdou sua natureza corrompida, como nos informa o relato de Gênesis 5.3: “Viveu Adão cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem, e lhe chamou Sete”.

Dentre todos os pecadores, igualmente merecedores do inferno, pois todos pecaram e carecem da glória de Deus… todos pecaram e o salário do pecado é a morte (Rm 3.23; 6.23) e espiritualmente mortos em seus delitos e pecados (Ef 2.1-2), o Senhor escolheu, baseado em sua livre e soberana Graça (Ef 2.8-9), um grupo de pessoas para que tivesse sua comunhão restaurada com seu Criador, comunhão essa que tinha sido perdida por ocasião da Queda. Essa perda da comunhão do homem com Deus pode ser vista quando Deus vai em busca do homem e o homem se esconde (Gn 3.8). Não pense que por escolher uma pessoa e não escolher outra Deus seja injusto, pois “quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Porque me fizeste assim? Ou não tem o oleiro tem direito sobre a massa, para do mesmo barro fazer um vaso para honra e outro, para desonra?” (Rm 9.20-21).

O pecador não é visto por Deus como o habitante de uma cidade, que tem os mesmos direitos de seus concidadãos, mas como um réu culpado e condenado, portanto, sem qualquer direito à liberdade, que aguarda o momento da execução da pena. O condenado vai para o inferno, mas não por culpa de Deus, que Deus não quis alcançá-lo pela graça. Isso seria equivalente a dizer que um réu vai para a cadeia porque o juiz não quis absolvê-lo. O pecador condenado vai para o inferno por causa de seu próprio pecado. Ao condenar o pecador ao inferno o Senhor não age com injustiça. Pelo contrário, executa sua justiça de forma plena, dando ao pecador rigorosamente o que ele merece. O eleito, por sua vez, vai para o céu por causa do propósito de Deus em alcança-lo pela graça. Nesse caso, a justiça também é feita, pois Cristo pagou o preço para que os escolhidos de Deus fossem salvos. A justiça de Cristo é imputada aos eleitos, fazendo-os justos aos olhos de Deus.

Como já vimos, o plano de Deus é restaurar a comunhão do homem consigo. Esse plano terá sua consumação no grande dia do Senhor, quando o redimido, com o corpo e a alma livres de qualquer pecado e corrupção, terá plena comunhão com seu Criador. Contudo, mesmo antes de alcançar essa plenitude da comunhão com Deus, o redimido tem comunhão com Deus em Cristo (2Tm 2.5) e deve zelar pelo desenvolvimento de sua santificação, que é a forma de que agora dispomos para manifestar esta comunhão. Sendo assim, podemos dizer que o propósito de Deus na eleição é a santificação de seu povo, que, quando for plena, ocasionará uma comunhão perfeita entre Criador e criatura. É essa faceta do propósito de Deus que encontramos nas palavras de Paulo: “…nos escolheu… para que fôssemos santos e irrepreensíveis”. Essa é a meta que o Senhor coloca diante daqueles em cujos corações ele já começou a operar seu plano de eterna eleição. Essa meta começa a ser alcançada no exato momento em que o Espírito aplica a obra de salvação no coração do pecador, chegando à sua total realização no grande dia do Senhor (Ap 21.27). Na presente vida, essa é a vontade de Deus: a nossa santificação (1Ts 4.3). Falaremos mais detidamente sobre isso na lição 12.

Conclusão

A eleição, em vez de minar nosso estímulo para crescermos em santificação, é na verdade a sua maior alavanca. Não existe estímulo maior para o cristão desenvolver sua santificação do que o fato de ter sido escolhido por Deus para desfrutar de uma comunhão plena e eterna com ele mediante a obra de Cristo. O pecador não possui mérito para apresentar-se diante de Deus e requerer sua salvação, mas o Senhor, graciosamente, providenciou uma forma segura pela qual alcança todos aqueles com os quais deseja manter uma comunhão perfeita e eterna em seu Reino: a eleição em Cristo.

Aplicação

Você percebeu a grandeza do amor e da graça de Deus, que nos amou e entregou seu próprio Filho por nós sem que tivéssemos nenhum mérito que o levasse a isso? A grandeza desse amor gracioso de Deus deve nos levar a uma postura de gratidão sincera e de louvor exultante ao nosso Criador e Salvador. Como você tem demonstrado sua gratidão a Deus em sua vida diária? Como você o tem louvado por sua salvação? Sua vida de santidade e obediência tem alguma coisa a ver com isso?

>> Autor: Vagner Barbosa
>> Estudo publicado originalmente pela  Editora Cultura Cristã. Usado com permissão.

Fonte